Escutar a Terra através dos seus Guardiões - as vozes que tecem o futuro

“Falamos muito de “soluções climáticas” em reuniões e conferências. Mas e se as comunidades da linha da frente forem a própria solução? E se a reparação não for caridade, mas um acto de devolução – de recursos, de dignidade – a quem já cuida da vida?”. As reflexões partem de Virgílio Varela, que regressou de cinco meses de viagem pelo Brasil acompanhado das vozes que foi escutando, “das terras alagadas do Rio Grande do Sul às florestas sagradas de palmeiras no Maranhão, passando pelo solo ancestral da Bahia”. Num percurso que incluiu a visita a “20 comunidades indígenas e quilombolas”, o facilitador, formador, consultor, orador e storyteller pôde recordar que “a justiça tem ritmo (...) como um tambor que nunca deixa de bater”. A experiência é partilhada a poucos meses da COP 30 – Conferência das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, que acontece de 10 a 21 de Novembro na Amazónia –, com a força de uma lição de vida. “A caminho da COP30, não levo apenas notas. Levo vozes. Vozes que dizem: não estamos à espera de salvação. Já estamos a tecer o futuro”. Por isso, o convite que Virgílio deixa “é simples: Não amplifiques apenas estas vozes. Segue a sua liderança”.

Virgílio Varela percorreu o Brasil durante cinco meses

Texto de Virgílio Varela

“Esta não foi uma jornada para ‘ajudar’ comunidades. Foi uma jornada para escutar, para desaprender — e para recordar o que a Terra já sabe.”

Durante cinco meses, percorri o Brasil — das terras alagadas do Rio Grande do Sul às florestas sagradas de palmeiras no Maranhão, passando pelo solo ancestral da Bahia — visitando 20 comunidades indígenas e quilombolas.

Não ia à procura de histórias. Ia ao encontro de territórios vivos de sabedoria.

Cada comunidade recebeu-me não com discursos ou formalidades, mas com alimento, ritmo e memória. Partilharam comigo as suas dores — grilagem, águas contaminadas, línguas silenciadas — mas também partilharam os seus sonhos.

E isso mudou tudo.

No Maranhão, sentei-me com mulheres que há gerações protegem o babaçu. Mostraram-me que resistir também pode ser plantar, cozinhar, ensinar.

Na Bahia, ouvi tambores que falam de realeza, de exílio e de regresso.

E no Sul, vi escolas destruídas pelas cheias e corações ainda em processo de cura — mas também jovens negros a replantar, regenerar e acreditar.

O que encontrei não foi apenas dor. Foi presença. Uma força ancestral que resiste a tornar-se estatística ou objecto de caridade.

Falamos muito de “soluções climáticas” em reuniões e conferências.

Mas e se as comunidades da linha da frente forem a própria solução?

E se a reparação não for caridade, mas um acto de devolução — de recursos, de dignidade — a quem já cuida da vida?

Esta jornada recordou-me que a justiça tem ritmo. Nem sempre é rápido. Nem sempre é ruidoso. Mas é constante — como um tambor que nunca deixa de bater.

A caminho da COP30, não levo apenas notas. Levo vozes.

Vozes que dizem: não estamos à espera de salvação. Já estamos a tecer o futuro.

O convite é simples:

Não amplifiques apenas estas vozes. Segue a sua liderança.

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